nem sequer a imagem que desenhaste de mim.
Mas também não sou o que julgo ser.
Sou o traço de união
entre o que faço e o que desejaria fazer.
Sou as reticências que se acrescentam
ao que apenas se deixa adivinhar.
Quando olhares para mim não esperes dogmas,
porque só quando o instante decisivo
irromper com a urgência do inevitável
eu te direi o que vou fazer.
Mas faço-o sem hesitações
e, então, nada nem ninguém me detém.
Não me peças conselhos porque se o fizeres
estás a escolher antecipadamente o meu rumo
e esse sou eu quem o constrói ao caminhar.
desde que me comecei a olhar este mundo.
Sou livre. Por isso sou capaz de escolher
até quando a opção parece impossível
e sei assumir todas as consequências,
mesmo que por vezes a dor me cegue.
Perguntas-me o que significa o amor para mim.
Respondo-te que é tão importante como a liberdade
e que sem eles me é impossível viver.
Por isso me lanço algumas vezes
num barco sem remos nem motor,
rumo ao oceano sem limites.
Queres conhecer-me? Desiste.
Eu própria me desconheço
embora cultive o hábito doloroso
de mergulhar no fundo do meu poço
p'ra colher surpresas e também desilusões.
Mas, tem um pouco mais de paciência.
Imagina alguém que se consome
no incêndio que ela própria alimenta,
que é palco das emoções mais adversas,
que em cada instante extravasa o seu próprio sentir,
que está sempre além da própria razão
e cujo sonho excede constantemente
as margens da contida realidade.
Imagina, por fim, alguém
que é albergue de todas as sensações,
que tenta pôr-se na pele de todas as refugiados,
sofrer todas as mágoas, rir todas as alegrias,
combater todas as injustiças,
estar ao lado de todos os oprimidos,
dar uma mão amiga a todos os pedintes,
compreender todos os marginais,
saltar, pular e brincar com as crianças,
dialogar com os adolescentes,
alguém capaz de pegar em armas
p'ra defender a liberdade e a democracia
Se é pouco o que te disse, procura tu o resto.
Não voltarei a falar-te de mim.
Prefiro sentir-me, sentir tudo.
Estou aqui à beira do abismo,
com olhos de águia para abarcar,
a imensidão do desfiladeiro.
Se não te apressas perdes-me.
É que estou sempre a partir.
Não levo malas comigo,
nem apanho um qualquer comboio.
Transporto tudo dentro de mim,
num excesso que por vezes transborda em solidão.
Não preciso de empurrões solícitos,
nem das vossas vozes tão sensatas e frias.
Vou por onde quero, para onde quero,
pelo caminho acidentado que escolhi.
Se tropeçar e cair é comigo.
Enquanto tiver forças levantar-me-ei só.
Chego onde chegar. Que vos importa isso?
O hoje não me satisfaz.
O meu destino é o depois de amanhã.
Maria Teresa Sampaio
Yellow fall trees_Utah, Foto de Robert Hooper, para o National Geographic
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