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sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

UM QUADRO COM HISTÓRIA - "GUERNICA", de PABLO PICASSO.


Guernica é uma cidade basca, na província de Biscaia, que, às 6:30 horas da manhã de 2.ª feira,  26 de Abril de 1937, durante a Guerra Civil de Espanha, foi bombardeada durante quase duas horas e arrasada pela força aérea de Hitler (Luftwaffe – Legião Condor), que apoiava as forças nacionalistas de Franco. A atrocidade dos atos então cometidos impulsionaram Pablo Picasso a pintar esta obra que, para sempre, ficaria como um libelo vibrante contra os horrores da guerra.
Foi este o painel que o artista pintou em resposta a uma encomenda que lhe tinha sido feita pelo Governo Republicano, a fim de figurar na Feira Mundial de Paris, [Exposition Internationale des Arts et Techniques dans la Vie Moderne ], em 1937.
A residir, então, na capital francesa, Picasso tomou conhecimento, pelos ecos da comunicação social, do horror da intervenção alemã e franquista. A inspiração não podia ser outra, embora outros esboços tivessem sido previamente experimentados. Para lá de uma posição política esta obra é, muito mais, uma demonstração do poder da arte manifestar um protesto contra a violência, o caos e a morte que resultam da guerra.
Diversas são as interpretações que continuam a ser dadas a todos os elementos que fazem parte desta pintura a preto, branco e cinzento. Picasso recusou-se sempre a revelar qualquer sentido oculto. Pressionado a explicar o que representavam o boi e o cavalo, disse: ... “este boi é um boi e o cavalo é um cavalo… Se derem um significado a certas coisas nas minhas pinturas pode ser verdade, mas não é ideia minha dar-lhe esse significado.” Porém, em “O Sonho e a Mentira de Francisco Franco”, também de 1937 embora anterior à Guernica, Picasso satiriza o ditador numa série de desenhos, representando-o como um monstro que devora o seu próprio cavalo e depois luta com um touro enraivecido.
Ao trabalhar no mural, Picasso disse: " A Guerra de Espanha é a luta da reação contra o povo. Toda a minha vida como artista tem sido uma luta contínua contra a reação e a morte da arte. Como pôde alguém pensar por um momento que eu estivesse de acordo com a reação e a morte?... No painel em que estou a trabalhar, a que chamarei “Guernica” e em todos os meus recentes trabalhos, claramente exprimo a minha aversão à casta militar que afundou a Espanha num oceano de dor e morte.”
À entrada do pavilhão espanhol na Feira Internacional de Paris, onde a “Guernica” foi pela primeira vez apresentada, estava um enorme painel fotográfico dos soldados republicanos, onde se podia ler:
“Lutamos pela unidade essencial de Espanha.
Lutamos pela integridade do solo espanhol.
Lutamos pela independência do nosso país e pelo direito do povo espanhol escolher o seu destino.

A exibição de “Guernica” era acompanhada por um poema de Paul Éluard.
Depois de Paris, esta obra maior da arte universal percorreu vários países do mundo, em toda a parte sendo recebida como um louvor à Paz e uma veemente denúncia da violência e da guerra.


LA VICTOIRE DE GUERNICA

I

Beau monde des masures
De la nuit et des champs

II

Visages bons au feu visages bons au fond
Aux refus à la nuit aux injures aux coups

III

Visages bons à tout
Voici le vide qui vous fixe
Votre mort va servir d'exemple

IV

La mort coeur renversé

V

Ils vous ont fait payer le pain
Le ciel la terre l'eau le sommeil
Et la misère
De votre vie

VI

Ils disaient désirer la bonne intelligence
Ils rationnaient les forts jugeaient les fous
Faisaient l'aumône partageaient un sou en deux
Ils saluaient les cadavres
Ils s'accablaient de politesses

VII

Ils persévèrent ils exagèrent ils ne sont pas de notre monde
VIII

Les femmes les enfants ont le même trésor
De feuilles vertes de printemps et de lait pur
Et de durée
Dans leurs yeux purs

IX

Les femmes les enfants ont le même trésor
Dans les yeux
Les hommes le défendent comme ils peuvent

X

Les femmes les enfants ont les mêmes roses rouges
Dans les yeux
Chacun montre son sang

XI

La peur et le courage de vivre et de mourir
La mort si difficile et si facile

XII

Hommes pour qui ce trésor fut chanté
Hommes pour qui ce trésor fut gâché

XIII

Hommes réels pour qui le désespoir
Alimente le feu dévorant de l'espoir
Ouvrons ensemble le dernier bourgeon de l'avenir

XIV

Parias la mort la terre et la hideur
De nos ennemis ont la couleur
Monotone de notre nuit
Nous en aurons raison.

Paul Eluard, Cours naturel, 1938


Guernica
Pablo Picasso
1937
Pintura a óleo
3,49m. x 7,76m.
Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofia, em Madrid.


Dezembro de 2014
mts

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Devagar


Devagar amor. Deixa o fogo penetrar lentamente
o leito húmido e suave do meu ser.
Não distraias o olhar senão no meu corpo.
Não fales. Ou melhor, murmura-me ao ouvido
aquilo que eu já sei mas tanto gosto de ouvir.
Não percas as tuas mãos em gestos inúteis,
deixa-as atear o lume deste tempo sem limites.
Devagar amor. Poisa as pétalas dos teus lábios
nos meus olhos guardadores de todos os astros
e vem mais lentamente ainda abrigar-te,
repousar à sombra do meu cansaço de criança feliz.
Devagar amor. Não vás deixar apagar as brasas.
Não suporto cinzas nem palavras sem sentido,
nem gestos bolorentos, nem um até amanhã displicente
como se a noite tivesse acabado
ao romper breve da madrugada.
Deixa-te estar imerso na minha ilha
e vem descobrir a música do silêncio
que eu compus para ti
com a cumplicidade de milhões de violinos
escondidos nas estrelas.



Teresa Sampaio

"Lovers" by Yves Pires.France

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

"Além-Deus"

Fernando Pessoa era um místico e um verdadeiro ocultista, que sabia distinguir o oculto por baixo das aparências, não se contentando com o aqui e o agora. Toda a sua obra é um hino ao outro lado, ao "Além-Deus", expressão que significa além da nossa humana e intelectual conceção de Deus. A própria vida é uma revelação e a poesia uma iniciação. A criação dos heterónimos foi um verdadeiro ato de alquimia em que se fragmentava para, aprofundando as várias camadas do ser, para encontrar a sua unidade, sabendo previamente e por intuição direta que iria encontrar em si mesmo a origem de tudo.
A poesia transcendental de Fernando Pessoa mergulha nas raízes do inconsciente coletivo. Recordo aqui as palavras de Jung (em “Poesia e Psicologia”): “A experiência poética, autêntica, aflora de regiões profundas da alma, salutares e benéficas, preexistentes à segregação das consciências individuais, e que, a partir desse regaço coletivo, seguiram os seus passos dolorosos. Brota dessas regiões onde todos os seres vibram ainda, em uníssono, e onde consequentemente a sensibilidade e a ação do indivíduo valem para toda a humanidade".
Segundo Fernando Pessoa, o “mistério”, que é tudo, não pode ser compreendido sem emoção, porque a inteligência não o capta. A verdadeira essência das coisas, da vida, de tudo, enfim, acha-se no fim do caminho, quando se intui que ela está, afinal, onde sempre esteve: dentro de nós.
Os textos de “O Caminho da Serpente”, mostram bem a dificuldade do “caminho”. Diz Fernando Pessoa, que “Todo o homem que tenha de talhar o caminho para o alto, encontrará obstáculos incompreensíveis e constantes”. Mais adiante acrescenta ”cercal-o-ão, não só resistências duras, como as que os penhascos erguem como tropeço, mas resistências brandas, como as memórias dos vales, e dos lares nas faldas. E o triunfo consiste na força para, sabendo sentir essas atrações, intensamente, (pois não sabel-as sentir é não ter alma para a subida), as submeter à emoção superior” (In Esp.54A-6, citado por Yvette Centeno na sua obra “Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética”, Editorial Presença, p.12).
“O Caminho da Serpente” é o caminho da sabedoria. 
Para alguns, a serpente é Fernando Pessoa, para outros é Portugal. 
É um caminho de agruras, de permanente descoberta interior, de descida às profundezas, de levantamento de camada sobre camada, retirando as máscaras, para depois ascender aos altos “píncaros”, “onde o ar está rarefeito”, como Nietzsche também disse. Só aí o homem estará, embora irremediavelmente só, finalmente liberto. 

10 de outubro de 2014
mts
***

“A serpente é o entendimento de todas as coisas e a compreensão intelectual da vacuidade d’ellas. Seguindo um caminho que não é o de nenhuma ordem nem destino, ela ergue-se à Altura que é a sua origem e evita os lugares por onde os homens passam.” […]
“É preciso quando se é serpente passar em Satan para chegar a Deus.” […] “E, quando sem ter caminho chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora.”

Fernando Pessoa. "O Caminho da Serpente"

Imagem: Lima de Freitas, retrata Fernando Pessoa e o "Caminho da Serpente", no painel de azulejos da gare do Rossio

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Lua redonda

Noites em que a lua atravessa a noite,
com um clarão que ilumina os pesadelos
e os transforma em sonhos.
Noites de lua cheia como as marés
que sobem nas praias e descobrem
os amantes em delírios de amor.
Noites que enchem as sombras de luz
e despertam emoções naqueles que
não se importam de sentir desvairadamente.


Teresa Sampaio


Nasci para gostar de gostar

nasci para antever a luz
por detrás das nuvens mais escuras
para sondar o insondável
e perscrutar o que não é visível ao olhar
nasci para aprender a aprender
e descobrir que tudo está por descobrir
nasci para lutar em todos os momentos
pela liberdade e saboreá-la
como o insaciável desejo de um fruto proibido
nasci para ser livre como um potro selvagem
que cavalga um mundo sem fronteiras
e sacode a mão que o quer subjugar
nasci para ser criança mãe e avó e novamente

criança na cristalina alegria dos risos gaiatos
no incansável jogo lúdico
do que se faz e desfaz e se volta a fazer
na fulgurante cumplicidade do amor

nos rarefeitos cumes do dever solitário
e no espanto criador
de quem se perde e se acha
para  além de todos os limites

nasci para caminhar à beira do abismo
aceitando o desafio de o transpor
e de um salto conhecer o lado de lá
da  vida num eterno e circular retorno

nasci para gostar de gostar

Teresa Sampaio



sábado, 16 de agosto de 2014

Aleister Crawley na Boca do Inferno

Fernando Pessoa escreveu a 4 de Dezembro de 1929 uma carta à Editora “The Mandrake Press”, com o pagamento de anteriores encomendas de livros de Crawley e solicitando que comunicassem ao Mago, que o seu horóscopo não estava correto e apresentando as razões. Aleister Crawley escreve, em reposta a Pessoa, confirmando que o escritor e astrólogo português tem razão. Começou, então uma interessante troca de correspondência, em que se tratavam por “Caro Frater” ou Caro Irmão”. O Mago inglês datava as cartas  com símbolos astrológicos,  terminava  com o seguinte parágrafo: “O amor é a Lei, ama segundo a vontade.” e assinava, de formas diferentes, uma das quais era, “Fraternalmente seu, 666”

A rede que Fernando Pessoa lançou surtiu os seus efeitos e Aleister Crawley, acompanhado da amante Hanni, chegaram a Lisboa, no paquete “Alcântara”, em 2 de Setembro de 1930 (3.ª feira). Fernando Pessoa foi esperá-los no cais. A história que se seguiu foi realmente recheada de episódios rocambolescos, aos quais Fernando Pessoa emprestou todo o seu pendor ocultista, policial e dramático.

A lápide a assinalar o pretenso suicídio de Aleister Crawley foi ali mandada colocar, em Maio de 2000, pelo então Vereador da Cultura, Relações Internacionais e Recursos Humanos, da Câmara Municipal de Cascais, José Jorge Letria, (com quem tive a honra de trabalhar, na qualidade de sua Adjunta), no encerramento de um Colóquio Internacional, dedicado a este tema, que contou com as presenças do Professor José Manuel Anes, Professora Yvette Centeno e Pier-Luigi Zocatelli,  Massimo Itrovigne e Gordon Melton,  entre outros ilustres investigadores de Pessoa, Crawley e o esoterismo.

mts


Do Diário de Notícias, de 16 de agosto se 2014, segue-se a notícia de :


Uma inventona com a cumplicidade de Pessoa



O DIA EM QUE O DN CONTOU: A 25 de novembro de 1930, o jornalista do DN Augusto Ferreira Gomes encontrou, no lugar chamado Mata Cães, uma carta e uma cigarreira. Ou diz que encontrou. E assim começa uma reportagem que, apesar de muito imaginativa, para não dizer falsa, está hoje perpetuada em mármore na Boca do Inferno, em Cascais. Com os nomes dos cúmplices: o jornalista, o DN e a sua revista O Notícias Ilustrado, o célebre mago Aleister Crowley e o poeta Fernando Pessoa.

 Pintor, poeta e astrólogo, Aleister Crowley já era célebre há décadas quando chegou a Lisboa em 1930. Com Pessoa, simulou o seu suicídio na Boca do Inferno, em Cascais. Aqui na capa do Notícias “Ilustrado”, revista fundada em 1930 que dava espaço à fotografia, em tons sépia

O bebé Neil Armstrong fazia dois meses a 5 de outubro de 1930 mas disso, evidentemente, o Diário de Notícias não se ocupou – a ida à Lua ainda era demasiado inverosímil. Na verdade, naquele domingo, o DN ia mais longe através dos acontecimentos ocorridos em Portugal com o mais famoso especialista dos mistérios do Universo. A sua revista de fim de semana – O Notícias Ilustrado, “a melhor revista gráfica portuguesa, a única feita em rotogravura”, como anunciara a edição do jornal na véspera – trazia na capa este título: “O Mistério da Boca do Inferno”. E prometia: “Neste número, sensacional reportagem de Augusto Ferreira Gomes sobre o desaparecimento do escritor Aleister Crowley”. A foto do desaparecido escritor, com a cabeça envolta num turbante, enchia toda a primeira página. Capa sensacional, sim, massem pingo de sensacionalismo, sobretudo olhada pelos dias de hoje: a história envolvia alguém que iria ser um dos símbolos de Portugal e, esse, não era referido no título. Mas, por 30 centavos, o leitor tinha lá dentro o testemunho de Fernando Pessoa! O mais extraordinário português do século e um dos maiores poetas de sempre (embora poucos ainda o soubessem) falava em exclusivo para a revista do DN sobre a sua participação nesse assombroso assunto.




Augusto Ferreira Gomes, o autor da reportagem, é amigo de Fernando Pessoa e até seu sócio numa firma de comissões. Também frequentador do Martinho da Arcada, há foto de ambos no café do Terreiro do Paço e descendo uma rua da Baixa.
O desaparecido referido na capa, Aleister Crowley (1875-1947) era uma personalidade mundial. Já em 1908, Somerset Maugham escolhera Crowley como modelo da sua personagem central no romance O Mágico. E, no seu livro de memórias Paris é uma Festa, Ernest Hemingway punha Crowley convivendo com Fitzgerald, Joyce, Ezra Pound e Picasso na capital da Europa nos anos 20… Naquele Outono de 1930, quando ele aparece e desaparece em Portugal, aos 55 anos, Crowley já era há décadas tratado nos títulos dos jornais da Europa e América como “o homem mais perverso do Mundo.” Propagandista do esoterismo e adepto do diabo, ele foi o divulgador moderno de Pazuzu, o demónio assírio que seria personagem do filme O Exorcista. Aleister Crowley iria prolongar a sua influência até ao rock demoníaco de Marilyn Manson e Ozzy Osbourne. Em 2002, um inquérito da BBC considerou Aleister Crowley um dos 100 maiores britânicos de sempre… Quanto a Augusto Ferreira Gomes (1892-1953) era um homem da casa, jornalista do DN. Adepto das teorias esotéricas e messiânicas, quatro anos depois desta reportagem o seu nome assina o livro “Quinto Império” – o prefácio é de Fernando Pesssoa, que no mesmo ano e na mesma editora (A.M. Pereira) publica Mensagem.

Em papel do Hotel de L’ Europe (hoje, é o hotel do Chiado), escrito pelo seu punho e com sinais cabalísticos, Crowley deixou uma carta: “Não posso viver sem ti”, enviada à sua amante, a jovem Hanni

Os factos, contados pelo jornalista do DN. A 25 de setembro, estava Augusto Ferreira Gomes “na Boca do Inferno, junto à abertura conhecida pelo nome de Mata Cães” quando encontrou uma carta e uma cigarreira. Não ligou muito, até porque sabia pouco do inglês em que a carta era escrita. Mas pelo papel da carta, que era endereçada a uma tal “Hanni L. Jaeger”, ele chegou ao Hotel de l’Europe – no mesmo edifício dos Grandes Armazéns do Chiado (hoje, é o Hotel do Chiado). E soube, pelo porteiro, que Hanni já se tinha ido embora e que estivera lá acompanhada por um tal “Edward A. Crowley”. Deu um sobressalto ao jornalista: querem ver que é o célebre mago! E como entretanto conseguira traduzir parte do bilhete – “não posso viver sem ti” -, o que ligado ao local perigoso onde se encontrara a carta, a Boca do Inferno, levou-o a prevenir a polícia. Ora Alexandrino de Albuquerque, diretor da Polícia de Investigação Criminal, sossega-o, dizendo-lhe que não só Crowley como Hanni – o inglês, pelo Sud Expresso (atravessou a fronteira de Vilar Formoso, a 23), a alemã, no vapor Werra, a 20 – tinham já abandonado Portugal, antes da carta aparecer. É então, estavam o jornalista e o polícia a falar, que, ó coincidência!, aparece Fernando Pessoa.



A lápide de mármore na Boca do Inferno.
Na conhecida escarpa sobre o oceano, em Cascais, uma pedra comemora os factos narrados nesta reportagem e nomeia a revista do DN, O Notícias Ilustrado


“Diga-se de passagem, uma das mais interessantes se não a mais interessante e superior mentalidade da minha geração”, diz do poeta, o jornalista. Pessoa confirma que a cigarreira e a letra da carta eram bem de Crowley. Por identidade de interesses astrológicos ambos já se correspondiam antes da visita do inglês. E a 2 de setembro, conta Pessoa, foi ao cais receber o amigo, que desembarcou com uma jovem e loira alemã. Encontrou-se com ele duas vezes, a última, “às 10H30 da manhã do dia 23, à porta do Café Arcada, no Terreiro do Paço e nunca mais falei com ele.” Mas, acrescentou viu-o. Ou, melhor, avistou-o. No dia 24, vinha Pessoa no elétrico da Estrela, “vi Crowley, ou o seu fantasma, na esquina do Café La Gare”, diz. No mesmo dia, “vi Crowley, ou o seu fantasma, entrar, com outro indivíduo, para a Tabacaria Ingleza”, diz também. Depoimentos que desmentem o atravessar da fronteira em Vilar Formoso a 23. Outro mistério: a carta encontrada na Boca do Inferno, esta datada “Sol em Balança”, em sinais dos astros, isto é, “depois das 18 horas e 36 minutos do dia 23 de setembro”, o que coloca Crowley em Lisboa a horas em que devia estar a sair do país. Ora, garante Pessoa, nenhum astrólogo como Crowley mentiria com sinais astrais.

Pintor, poeta e astrólogo, Aleister Crowley já era célebre há décadas quando chegou a Lisboa em 1930. Com Pessoa, simulou o seu suicídio na Boca do Inferno

A reportagem do DN teve repercussões naturais no estrangeiro e até a Scotland Yard abriu inquérito. Mas Crowley aparece em Berlim, semanas depois na exposição de quadros seus. Fernando Pessoa diz em carta àquele que será seu biógrafo, João Gaspar Simões: “O Crowley, que depois de se suicidar passou a residir na Alemanha, escreveu-me há dias…” E o poeta aproveita para publicar na revista Presença a sua tradução do poema de Aleister Crowley Hino a Pã…. Fonte: Diário de Notícias

FERREIRA FERNANDES 


 Nota minha: a ordem das fotografias foi alterada para conveniência do Blog.

terça-feira, 12 de agosto de 2014

Robin Williams deixou-nos.

Robin Williams partiu para sempre.

Robin McLaurim Williams já não está connosco. Infelizmente!
Perdeu-se um enorme ator, quer na comédia, quer no drama.
Fez-nos rir. Fez-nos chorar. Fez-nos pensar. 
Os que o conheceram, pessoalmente, louvam-lhe as qualidades de ser humano, a sensibilidade, a gentileza, a bondade e fraternidade. Não duvido.

Sinto-me triste, como se tivesse morrido uma pessoa da minha família. Essa era também uma das suas grandes qualidades: fazer-nos sentir solidários com ele, com os papeis que desempenhava, com tanta mestria.
Conseguiu fazer-me rir com um tema que deplorava, a guerra no Vietnam. É difícil esquecer o seu “Good morning, Vietnam!”
É difícil esquecer: “O captain, my captain!”, no Clube dos Poetas Mortos” em que merecia ter ganho um Oscar.
É difícil esquecer o psicólogo de “O Bom Rebelde”, que lhe valeu, então, o Óscar de melhor ator secundário.
É difícil esquecer o ser humano perturbador na sua demência, mas também poético, em “O Rei Pescador”
Lembrar-me-ei sempre de: Um russo em Nova Iorque “, “Depertares”, “Hook”, “Casa de Doidas” e "Patch Adams".

Não me interessam especulações sobre a sua morte.

Só me importa este amargo sentimento de desolação, e tristeza imensa por não o voltar a ver, quer como ator, quer nas suas entrevistas no Jay Leno, que nunca esquecerei.
Sou completamente solidária com a dor insuportável que estaria a sentir e que, eventualmente, lhe arrancou toda a vontade de continuar a viver.
Como os americanos dizem, “he was one of a kind”.
Robin Williams teve a capacidade extraordinária de entrar e permanecer nas nossas vidas, tocando-nos com o seu génio.
Chorei, sim, quando o meu filho me deu a notícia, antes de qualquer televisão, rádio ou rede social.
A saudade que já sinto de Robin Williams, essa não vai morrer nunca.
Parece que o ouço dizer:
"Carpe diem! Aproveitem o dia, meninos.Tornem as vossas vidas extraordinárias."
E, no entanto, aos 63 anos, ele não suportou continuar a viver, apesar de ter tido uma vida como ator extraordinária. 
Recordarei sempre aquelas palavras, o homem e o ator que foi Robin Williamns.

Nascimento: 21 de julho de 1951, Chicago, Illinois, EUA

Falecimento: 11 de agosto de 2014, Tiburon, Califórnia, EUA

mts


"Good morning Vietnam!"
"Clube dos Poetas Mortos"
"O bom selvagem"

"O Rei Pescador"  


segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Eu queria...

Eu bem queria deixar-me encantar por um pôr de sol deslumbrante, ao ponto de apenas ser capaz de o ver e o sentir.
Mas não. 
Não sou capaz de deixar de ouvir os gritos dos palestinianos que morrem às mãos do Estado invasor de Israel.
Não sou capaz de deixar de ver o olhar aterrorizado das crianças palestinianas que morrem sem crescer nem conhecer o futuro.
Não sou capaz de esquecer a visão de Gaza em ruínas, enquanto Israel e os Senhores do mundo dali lavam as mãos e seguem em frente.
Não sou capaz de esquecer que faço parte de uma única raça, a humana, e que irmãos meus estão a morrer à míngua de socorro.

mts




sábado, 2 de agosto de 2014

Dias negros

Há dias de tanta angústia
Que não sei do que ela é.
Não sei se me sobra o sonho.
Não sei se me falta a Fé.
Fernando Pessoa

Estes têm sido dias como esses de que Fernando Pessoa escreveu com tanta alma e génio.

Ouvir, ler e ver, logo pela manhã o horror que se passa em Gaza; ver homens palestinianos correndo, por entre os destroços daquele pedaço martirizado de terra, com os filhos mortos nos braços; sentir a dor das mulheres, mães e avós que pranteiam, de olhos postos no céu; ver aquele povo à procura das casas que as bombas israelitas já destruíram e, em seu lugar, encontrar pedras; verificar que o vírus Ébola vai alastrando e ceifando os desafortunados, em África; saber e sentir na pele que, em Portugal, continuam a ser os mais desprivilegiados a pagar a crise e ter a certeza que os grandes gatunos e biltres - os donos de Portugal - vão escapando nas malhas de um Estado corrupto e nepotista, que não só os protege como também os recompensa e galardoa; tudo isto e muito mais cria em mim uma angústia, um nojo e uma vergonha, que quase conseguem envenenar-me os dias e torná-los negros como uma noite sem luar nem estrelas.

Hoje, não consigo sentir alegria. Quase me sentiria culpada.
Há dias assim, em que todo o pranto não chega para chorar tanto mal e a própria esperança parece envenenada. 

mts



 



sábado, 26 de julho de 2014

O genocídio dos Palestinianos

A soberba do homem o abaterá, mas o humilde de espírito obterá honra.
Provérbios 29.23
O mal é doce no começo, mas amargo no fim.
 Talmude babilónico

Aos poucos, Israel, com a cobertura total dos EUA e de outros países, alguns dos quais europeus, vai riscando  a Palestina do mapa.
.
No séc. XIX, com a fundação do movimento sionista, os judeus começaram a emigrar para a Palestina, onde compraram terras, quer ao Império Otomano, quer às comunidades árabes. Fizeram, então, circular o slogan famoso: "a Palestina é uma terra sem povo para um povo sem terra". Desde a criação do Estado de Israel, que os israelitas avançam, a ferro e fogo, sobre terras da Palestina, hoje reduzida à Faixa de Gaza.
A ONU é inoperante. Os países árabes, também, pouco ou nada apoiam a Palestina. Israel continua arrogantemente a não cumprir nenhuma resolução das Nações Unidas. Tem as costas bem quentes pelos EUA.

Este povo morre lentamente, há décadas. O mundo, com algumas exceções, assiste impávido ao seu genocídio perpetrado por Israel.
O solo fica coberto de "danos colaterais", que perfazem milhares. Israel não faz distinção entre homens, mulheres e crianças. Todos são palestinianos e isso lhes basta para serem condenados à extinção absoluta.

Disse o rabino Moisés Hayim Luzzato que "O instinto do mal é extremamente forte no homem; se não é combatido cresce sempre mais e apodera-se dele dominando-o." Tem razão, mas parece que pregou aos peixes. O instinto do mal apoderou-se dos judeus, que já esqueceram o quanto sofreram, como vítimas do Holocausto. Agora, são eles que erguem muros, avançam triunfantemente sobre o solo palestiniano e matam crianças e velhos indefesos, indiscriminadamente. Têm as mãos manchadas de sangue e os olhos turvados pela ganância. Podem rolar pelo chão palestiniano as cabeças de mulheres, homens e jovens. Pouco importa. O seu destino é morrer às mãos dos judeus, sem piedade. Alegam que os palestinianos ripostam com pedras, rockets e alguns mísseis. E então? Não têm também o direito à defesa. E, no entanto não têm Exército, nem Força Aérea, nem Marinha. Por acaso já repararam na desproporção de meios e, consequentemente, de mortos?











O que vemos são palestinianos: pais com os filhos mortos nos braços e mães, desesperadas, a chorar e a gritar com os braços erguidos para o céu.

O que vemos são centenas de famílias que fogem da sua terra, porque as suas casas foram destruídas, ficaram sem nada e perderam os seus familiares, mortos por Israel.

O que vemos é a agonia infindável de um povo, que Israel quer banir da face da terra.

O que vemos é o horror e o medo refletido nos olhos das crianças palestinianas, perante as explosões e os corpos espalhados pelo chão da sua terra.

O que vemos é o reino do terror e da morte, sem tréguas, que Israel instaurou impunemente. a ser consumado.

A Palestina vai-se extinguindo, como uma vela que se apaga. O genocídio está  a ser consumado. Metodicamente. O mundo olha sem ver.

"Com a medida com que medires serás medido."
Talmude babilónico

mts







quarta-feira, 23 de julho de 2014

PALESTINA

Ainda que hoje as balas e os mísseis
sibilem sobre a terra palestiniana,
e deixem atrás de si um rasto
de sangue e de morte;
Ainda que, hoje, o povo palestiniano
seja obrigado a abandonar a sua terra 
e a viver na miséria;
Ainda que Israel possa cometer crimes de guerra
contra a Humanidade, no genocídio
do povo palestiniano;
O clamor pela paz,
um dia, tornar-se-á mais forte
que os interesses de Israel
e dos países que o sustentam,
e a Palestina será um País 
livre de pleno  direito.


mts