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domingo, 24 de janeiro de 2016

Purity - Jonathan Franzen

Purity (PIP ) é o nome da protagonista do livro, uma jovem que terminou o seu curso universitário e trabalha, desesperada, para pagar a dívida ao Banco que financiou os seus estudos universitários. 
Todo o romance é construído em busca da identidade perdida. Ela sabe pela sua mãe que o nome de ambas não é o verdadeiro e desconhece quem é o pai, porque a mãe recusa contar-lhe a sua verdadeira história de vida. A mãe de Pip é uma personagem radical, manipuladora, complexa, com evidentes problemas psicológicos, mas, ainda assim, sedutora. 


Purity, no sentido de integridade, pode também ser uma alegoria deste romance. Na democracia, mas também no caos da nossa sociedade, em que o reino da Internet ainda é omnipresente, Jonathan Franzen procede a uma brilhante desconstrução dos mitos que acompanham, vulgarmente, o sonho americano, com um vigoroso idealismo e generosidade de espírito, acompanhados de uma ironia e mordacidade que se impõem como o verdadeiro estilo deste romance, sem retoques literários ou sequer poéticos.


Purity, que Colm Tobin, no New York Times, considerou um romance tão “ambicioso”, quanto de “plenitude and panorama” podia resvalar,  se Jonathan Franzen não tivesse a tremenda habilidade de conseguir colocar o leitor na cabeça de todos os seus personagens (e são muitos), agarrando-o, de cada vez que corre o perigo de se perder, no meio da abundância de características e pormenores.
 
Há outras duas personagens, para além de Pip, que preenchem secções inteiras do livro: aquele que se descobre, quase no fim, ser o  pai, Tom Aberant, um homem sério, íntegro, com “um sentido de dever morbidamente exacerbado”, que dirige um site de jornalismo de investigação on line  e Andreas Wolf, dissidente  alemão da RDA, com uma personalidade completamente manipuladora e, por vezes border line, carismático e bem parecido, que dirige, na Bolívia, o Projeto Luz Solar, parecendo querer superar Snowden e Assenge, que ele vitupera. Com base na investigação e na pirataria informática, denuncia  governos corruptos e empresas que abusam do poder. 
Segundo Andreas Wolf:
“A razão pela qual ainda temos sucesso e a WikiLeaks está a afundar-se (pág. 606) é que as pessoas acham o Assange é um tarado sexual autista e megalómano. As suas capacidades tecnológicas não se alteraram. O que se alterou foi que as pessoas que têm conhecimento de sujidades, não vão levá-las a uma pessoa suja. As pessoas que expõem sujidades fazem-no porque estão desejosas de limpeza.”
Em defesa do jornalismo, contra a pirataria informática, Jonathan Franzen expõe o que pensa, através de Leila Helou, jornalista do Denver Independent (do qual Tom Aberant era diretor): 
“Os delatores limitam-se a vomitar informação. Cabe ao jornalista verificar, condensar e contextualizar a informação que eles vomitam” e, mais adiante, acrescenta: “Andreas Wolf é um homem tão cheio de segredos pessoais sujos, que vê o mundo inteiro como segredos sujos”.


Com uma superior capacidade de observação social de certos ambientes e relações humanas disfuncionais, das sociedades do nosso tempo e, das redes que, através da Internet, ligam todo o mundo, Jonathan Franzen constrói um poderoso romance intersecionista, com um estilo narrativo coloquial, informativo, na primeira pessoa, por vezes irónico, por vezes satírico, simples, sem quaisquer floreados. O recheio é já por si só muito intenso e variado, com um homicídio, um suicídio, segredos, manipulações e mentiras, prendendo completamente a atenção do leitor. O estilo de Franzen em Purity é como se ele pretendesse apenas absoluta clareza.

Purity é um complexo mosaico de histórias de pessoas e de lugares que se intersecionam,  desde a Alemanha de leste, à Stasi, à queda do Muro de Berlim, à Califórnia, ao Colorado e à Bolívia.


Franzen consegue  escrever com seriedade, inteligência  e humanismo  sobre a  condição humana.
É, sem dúvida, um dos maiores escritores do nosso tempo.



Jonathan Franzen, Purity. D. Quixote, 1.ª edição: setembro de 2015


Maria Teresa Sampaio

24 de janeiro de 2016



1 comentário:

catarina disse...

Obrigada mãe pela excelente análise crítica deste livro, o qual parece ser de facto muito bom. E não há nada como um bom livro para nos transportar e enriquecer! :)