"I have a dream that my four little children will one day live in a nation where they will not be judged by the color of their skin but by the content of their character."...
Exatamente há 50 anos, a 28 de agosto de 1963, Martin Luther King discursava frente a 250 mil ativistas, no Memorial a Lincoln, em Washington, um acontecimento que serviu de bandeira na luta pela igualdade racial a nível mundial.
Martin Luther King proferiu o seu célebre discurso sobre os direitos humanos e a liberdade, contra o racismo (que, infelizmente, ainda hoje existe por todo o lado), sendo a sua mais conhecida frase: "I have a dream", repetida um pouco por todo o mundo até aos dias de hoje. Ninguém a esqueceria, jamais, e ficaria para sempre associada ao seu corajoso autor.
Para além do inegável impacto político que lhe seria associado, este discurso é uma das mais brilhantes peças de oratória alguma vez proferidas, com componentes poéticas e religiosas que comoveram o mundo e valeram a Luther King muitas ameaças de morte.
Pouco tempo mais de vida lhe estava destinado. Seria assassinado, já depois de lhe ter sido atribuído o Prémio Nobel da Paz, cinco anos mais tarde, no auge do combate pelos direitos civis da população negra.
Pouco tempo mais de vida lhe estava destinado. Seria assassinado, já depois de lhe ter sido atribuído o Prémio Nobel da Paz, cinco anos mais tarde, no auge do combate pelos direitos civis da população negra.
Hoje os EUA têm o seu primeiro
Presidente negro, Barac Obama que discursa no mesmo local, de há 50 anos,
em homenagem a Martin Luther King.
Porém, há
mais diferenças do que semelhanças entre os dois líderes. Martin Luther King
tinha opiniões muito distintas do Presidente Obama, principalmente no que
concerne ao militarismo dos Estados Unidos. Luther King identificava-se com o
movimento pacífico pela não-violência, fundado por Mahatma Gandhi, e
frequentemente discursava contra a guerra do Vietnam. A sua posição seria
certamente crítica também hoje.
No
entanto, também é preciso ter em conta que vivemos tempos e épocas muito
distintos. King não testemunhou os ataques do 11 de Setembro ou as consequentes
guerras no Afeganistão e no Iraque. E Barack Obama não teve que viver sob o
regime racial que corporizava a legislação norte-americana até 1964.
Mas
isso não significa que Obama não tenha que fazer frente ainda a formas de
racismo, que hoje se apresentam de forma mais subtil. Está bem recente nas
nossas memórias atuais o assassinato “acidental” do jovem negro Trayvon
Martin e não podemos esquecer o número desproporcional de negros nas prisões
americanas, bem como a gentrificação das grandes cidades.
Penso,
apesar de tudo, que Martin Luther King, nunca seria presidente dos EUA. Se
vivesse hoje, estaria a lutar, nas ruas e nas iguejas, por um país livre de armas e de lobbies, contra
intervenções armadas no estrangeiro para satisfazer a ganância dos senhores da
alta finança e encabeçaria a frente dos movimentos civis por um país realmente melhor e igual para todos. Se vivesse hoje não ignoraria uma Humanidade carente dos
esforços unidos de todas as pesssoas de bem, de todas as cores, para acabar com
a fome, a miséria, o fosso cada vez maior entre ricos e pobres, o trabalho
infantil, a violência exercida sobre mulheres e crianças. Se vivesse hoje ainda
estaria à frente de todos os que se unem pelo direito universal à educação, à
saúde e a um trabalho digno para todos. Se vivesse hoje talvez tudo fosse um pouco diferente. Porque ele saberia, de novo, dar alento a todos os que já perderam a esperança e, quem sabe, poderia reacender-se ainda a chama da luta.
Martin Luther King foi o meu ídolo de adolescente. Bebi as suas palavras, Fortaleci-me na sua audácia e na sua coragem. Devo-lhe muito do que fui e sou. Ele faz parte da minha história de vida e isso já ninguém me pode tirar.
Segue-se o texto do:
Discurso de Martir Luther King, Jr
na Marcha para Washington, 1963
“EU TENHO UM SONHO”
Há cem anos passados, um grande americano, sob cuja simbólica sombra nos encontramos, assinava a Proclamação da Emancipação. Esse importante decreto foi como um raio de luz de esperança para milhões de escravos negros que tinham sido marcados a ferro nas chamas de vergonhosa injustiça. Veio como uma aurora feliz para terminar a longa noite do cativeiro.
Mas, cem anos mais tarde, devemos enfrentar a realidade trágica de que o Negro ainda não é livre. Cem anos mais tarde, a vida do Negro é ainda lamentavelmente dilacerada pelas algemas da segregação e pelas correntes da discriminação. Cem anos mais tarde, o Negro continua a viver numa ilha isolada de pobreza, no meio de um vasto oceano de prosperidade material. Cem anos mais tarde, o Negro ainda definha à margem da sociedade americana, encontrando-se no exílio na sua própria pátria. Assim, encontramo-nos aqui hoje para dramatizarmos tal consternadora condição.
En certo sentido, viemos hoje à capital de nossa nação para descontar um cheque. Quando os arquitetos de nossa república escreveram as palavras majestosas da Constituição e da Declaração de Independência, estavam a assinar uma nota promissória da qual cada cidadão americano seria herdeiro. Essa nota foi uma promessa de que todos os homens teriam garantidos os seus inalienáveis direitos à vida, à liberdade e à busca da felicidade.
É óbvio que ainda hoje a América não pagou a nota promissória no que diz respeito aos seus cidadãos de cor. Em vez de honrar tal compromisso sagrado, a América deu ao Negro um cheque sem cobertura; um cheque que foi devolvido com a seguinte inscrição: “sem cobertura”. Porém, recusamo-nos a aceitar a ideia, de que o banco da justiça está falido. Recusamo-nos a acreditar que não existirem fundos suficientes nos grandes cofres de oportunidades desta nação. Por isso viemos aqui para cobrar o tal cheque – um cheque que nos será pago com as riquezas da liberdade e a segurança da justiça.
Também viemos a este lugar sagrado para lembrar à América a veemente urgência do agora. Este não é o tempo para relaxarmos, nem para tomarmos a pílula tranquilizante do gradualismo.
Agora é tempo para que se tornem reais as promessas da Democracia.
Agora é tempo de nos erguermos do vale escuro e desolado da segregação para o caminho iluminado da justiça racial.
Agora é tempo de abrir as portas da oportunidade para todos os filhos de Deus.
Agora é o tempo de levantar a nossa nação da areia movediça da injustiça racial para a rocha sólida da fraternidade.
Seria fatal para a nação não levar a sério a urgência do momento e subestimar a determinação do Negro. Este sufocante verão do descontentamento legítimo do Negro não passará até que ocorra o revigorante outono da liberdade e igualdade.
1963 não é um fim, mas um começo. Aqueles que crêem que o Negro precisava apenas desabafar, e que agora ficará contente como está, terão um rude despertar se a Nação retornar à sua vida normal como sempre. Não haverá tranquilidade nem descanso na América até que o Negro tenha garantidos todos os seus direitos de cidadania. Os turbilhões da revolta continuarão a sacudir as fundações de nossa Nação até que desponte o luminoso dia da justiça.
Existe algo, porém, que devo dizer ao meu povo que se encontra no caloroso limiar que conduz ao palácio da justiça. No processo para ganharmos o nosso lugar de pleno direito, não devemos praticar atos irregulares. Não busquemos satisfazer a sede pela liberdade tomando a taça da amargura e do ódio. Devemos conduzir sempre a nossa luta no plano elevado da dignidade e disciplina.
Não devemos deixar que o nosso protesto criativo degenere em violência física.
Sempre e cada vez mais devemos erguer-nos às alturas majestosas de enfrentar a força física com a força da alma. Esta maravilhosamente nova militância que submergiu a comunidade negra não nos deve levar a desconfiar de todas as pessoas brancas, pois muitos de nossos irmãos brancos, como está evidenciado pela sua presença aqui, hoje, estão conscientes de que os seus destinos estão ligados ao nosso destino, e que a sua liberdade está instrinsicamente unida à nossa liberdade .
Não podemos caminhar sozinhos.
Á medida que caminhamos, devemos assumir o compromisso de marcharmos avante.
Não podemos retroceder. Existem aqueles que perguntam aos devotados aos direitos civis: “Quando é que vocês ficarão satisfeitos?”
Não podemos ficar satisfeitos enquanto o Negro for vítima dos horrores incontáveis da brutalidade policial. Não podemos ficar satisfeitos enquanto os nossos corpos, pesados pela fadiga da viagem, não puderem encontrar um lugar de descanso nos motéis das estradas e nos hotéis das cidades.
Não podemos ficar satisfeitos enquanto a mobilidade básica do Negro passa de um gueto pequeno para um maior.
Não podemos ficar satisfeitos enquanto o Negro for vítima dos horrores incontáveis da brutalidade policial. Não podemos ficar satisfeitos enquanto os nossos corpos, pesados pela fadiga da viagem, não puderem encontrar um lugar de descanso nos motéis das estradas e nos hotéis das cidades.
Não podemos ficar satisfeitos enquanto a mobilidade básica do Negro passa de um gueto pequeno para um maior.
Não podemos ficar sastisfeitos enquanto as nossas crianças forem despojadas da sua dignidade por sinais que estabelecem "Só para brancos".Não podemos jamais ficar satisfeitos enquanto um Negro no Mississipi não poder votar e um Negro em Nova York pensar que não existe nada pelo qual votar.
Não, não, não estamos satisfeitos, e não ficaremos satisfeitos até que a justiça corra como água e a retidão também, como uma poderosa correnteza.
Não desconheço que alguns de vós vieram aqui com muitas dificuldades e tribulações. Alguns de vós saíram recentemente de diminutas celas de prisão. Alguns de vós vieram de áreas onde a busca pela liberdade vos deixou marcas das tempestades de perseguição e vos fez tremer pelos ventos da brutalidade policial. Vocês são veteranos do sofrimento criativo. Continuem a trabalhar com a fé de que um sofrimento imerecido é redentor.
Voltem ao Mississipi, voltem ao Alabama, voltem à Carolina do Sul, voltem à Geórgia, voltem à Louisiana, voltem à favelas e aos guetos de nossas modernas cidades, sabendo que, de alguma forma, esta situação pode e será alterada.
Não nos espojemos no vale do desespero.
Digo-vos, hoje, meus amigos, que apesar das dificuldades e frustrações do momento, ainda tenho um sonho. É um sonho profundamente enraizado no sonho americano.
Tenho um sonho que um dia esta nação levantar-se-á e viverá o verdadeiro significado da sua crença.
“Afirmamos que estas verdades são evidentes; todos os homens foram criados iguais”.
Tenho um sonho que um dia nas montanhas rubras da Geórgia os filhos de antigos escravos e os filhos de antigos donos de escravos poderão sentar-se à mesa da fraternidade.
Tenho um sonho que um dia o estado do Mississipi, um estado deserto sufocado pelo calor da injustiça e opressão, será transformado num oásis de liberdade e justiça.
Tenho um sonho que os meus quatro filhos pequenos viverão um dia numa nação onde não serão julgados pela cor de sua pele, mas pelo conteúdo de seu caráter.
Tenho um sonho, hoje.
Tenho um sonho que um dia no estado de Alabama, cujos lábios do governador atualmente pronunciam palavras de "nterposição" e "anulação", os meninos negros, e as meninas negras, possam dar as mãos e caminhar juntos, lado a lado, como irmãos e irmãs.
Tenho um sonho, hoje.
Tenho um sonho que um dia todo o vale será exaltado, toda a montanha e encosta serão niveladas, os lugares ásperos tornar-se-ão lisos, e os lugares tortuosos serão direcionados, e a glória do Senhor será revelada, e todos os seres a verão, juntos
Esta é nossa esperança. Esta é a fé com a qual regresso ao sul. Com esta fé seremos capazes de arrancar à montanha do desespero uma pedra de esperança. Com esta fé poderemos transformar as dissonantes discórdias de nossa nação numa linda sinfonia de fraternidade. Com esta fé poderemos trabalhar juntos, orar, juntos, lutar juntos, ir para a prisão juntos, erguermo-nos pela liberdade juntos, sabendo que um dia seremos livres.
Esse será o dia em que todos os filhos de Deus poderão cantar com um novo significado: “O meu país é teu, doce terra de liberdade, de ti eu canto. Terra onde morreram os meus pais, terra do orgulho dos peregrinos, de cada rincão e montanha que ressoe a liberdade”.
E se a América for destinada a ser uma grande nação isto tornar-se-á realidade.
Que a liberdade ressoe destes prodigiosos planaltos de New Hampshire. Que a liberdade ressoe destas poderosas montanhas de New York.
Que a liberdade ressoe dos elevados Alleghenies da Pensilvânia!
Que a liberdade ressoe dos nevados cumes das montanhas Rockies do Colorado!
Que a liberdade ressoe dos picos curvos da Califórnia!
Não somente isso; que a liberdade ressoe da Montanha de Pedra da Geórgia!
Que a liberdade ressoe da Montanha Lookout do Tennessee!
Que a liberdade ressoe de cada Montanha e de cada pequena elevação do Mississipi.
De cada rincão e montanha, que a liberdade ressoe.
E quando isto acontecer, quando permitirmos que a liberdade soe, quando a deixarmos ressoar em cada vila e em cada aldeia, de cada estado e de cada cidade, seremos capazes de apressar o dia em que todos os filhos de Deus, negros e brancos, judeus e gentís, protestantes e católicos, hão de poder dar as mãos e cantar as palavras da antiga canção espiritual negra:
“Finalmente livres! Finalmente livres!
Graças ao Deus, todo poderoso, estamos finalmente livres!”
2 comentários:
Obrigada pela tradução e partilha. MLK nunca deverá ser esquecido, porque os sonhos não têm fim e os sonhadores vêem mais longe.
Grande discurso, Homem Maior, luta digna e corajosa. A sua importância ainda hoje é ilimitada e espero que nunca seja esquecido.
Obrigada, mãe pela partilha e pela tradução! Ora cá está um bom serviço prestado à comunidade! :)
Passem a palavra!
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